sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Abraham Lincoln - Caçador de Vampiros (Seth Grahame-Smith)

GRAHAME-SMITH, Seth. Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros. Tradução de Alexandre Barbosa de Souza. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2010.

"Fatos

1. Por mais de 250 anos, entre 1607 e 1865, os vampiros floresceram nas sombras da América. Raros eram os humanos que acreditavam neles.

2. Abraham Lincoln, que foi um talentoso caçador de vampiros de seu tempo, manteve um diário secreto sobre uma vida inteira dedicada a combatê-los.

3. Durante muito tempo, rumores a respeito da existência desse diário foram um dos temas prediletos dos historiadores e biógrafos de Lincoln. A maioria deles considera tudo isso um mito."

Assim tem início o livro. Sim, um mito que Seth Grahame-Smith resolveu quebrar em 2010, quase um ano após ter ele próprio tomado conhecimento dos estranhos fatos que envolveram a vida do 7º presidente dos Estados Unidos, Abraham Lincoln. E é exatamente desta forma que se inicia o primeiro capítulo do livro: o próprio autor se torna personagem para justificar o tema do seu romance. Na verdade não foi um lampejo da imaginação, mas uma incumbência recebida de Henry Sturges, um vampiro que se tornou um grande amigo de Abraham, um vampiro diferente da maioria.
 
A vida de Abe tem cheiro de morte. A primeira de todas foi a que determinou a sua história: a morte da sua mãe Nancy Hanks. A princípio sua causa foi considerada inexplicável (como muitas na época, em verdade). Anos depois, entretanto, Abe soube o verdadeiro motivo através do seu próprio pai: vampiros. Desde então a luta contra estes seres não-humanos (ou mortos-vivos, como chamava Abe), tornou-se seu objetivo de vida.
 
Uma das fotos que ilustra o livro e que colaboram para formar um fundo grotescamente real à história. As fotos são reais, porém modificadas no Photoshop.

Os vampiros do relato de Seth Grahame-Smith não são exatamente como aqueles que estamos costumados a ouvir falar. Algumas características, claro, permanecem as mesmas: sensibilidade à escuridão, presas. Mas, diferente das outras histórias, aqui eles vivem entre nós e se passam por pessoas normais, apesar de suas características um tanto peculiares: são seres extremamente pálidos e de estatura pequena. E o mais importante: “fadados” à vida eterna.
 
Falo da vida eterna como um fado, pois ao contrário daqueles que almejavam encontrar a “Pedra Filosofal”, não vejo com bons olhos a vida sem perspectivas de fim, na trilha daquilo que Stephen King estampou com maestria em seu livro À espera de um milagre. Também aqui encontramos o mesmo pensamento, vindo de Henry, o amigo de Abe: “Os homens vivem presos pelo tempo – disse ele. – Assim, a vida deles possui urgência. O que lhes dá ambição. Faz com que escolham as coisas mais importantes; apeguem-se mais firmemente ao que lhes é mais caro. A vida tem estações, ritos de passagem e consequências. E, enfim, fim. Mas o que é uma vida sem urgência? Onde está a ambição? E o amor?
 
Henry, apesar da sua condição eterna, é um vampiro que consegue fugir da sua essência natural. Henry, creio eu, representa nós mesmos: seres humanos, animais, que, com a racionalidade, superam os brutos instintos. Superam e sentem, em sua vida, a urgência da vida. Mas, claro, nem todos os seres humanos superam os instintos animais. Nem todos os seres humanos atravessam a vida com “vida”. São esses “vampiros” fadados à sua natureza que Henry combate, com a ajuda do seu fiel caçador, Abraham Lincoln.

A luta contra a escravidão, medalha que carrega o 7º presidente dos Estados Unidos, foi, na verdade, uma luta contra os vampiros. Uma luta contra aqueles seres (nós ou eles?) que se alimentavam da força de seres em condições fáticas inferiores. Foi uma libertação da condição mais bruta do ser humano. Sim, acho que foi isso que Seth Grahame-Smith quis estampar nas 330 páginas que compõem seu livro: um retrato de alguns integrantes da humanidade.

O Autor já é famoso por mesclar realidade com fantasia. Seu primeiro livro famoso foi Orgulho e Preconceito e zumbis (que, admito, observei não sem preconceito). Mas, se por um momento as sombras do preconceito podem passar à frente das mentes mais desavisadas, a verdade é que a fantasia é somente uma figura de linguagem para se contar uma realidade. Como escreveu meu querido pai, de quem ganhei o livro de presente de aniversário, e que recheou meu exemplar com uma bela dedicatória: “A vontade movida pelo desejo muitas vezes encontra o caminho da ficção para a sua realização. Os símbolos e os mitos podem não ser reais, mas moldados pela imaginação constroem histórias que, por vezes, forjam a vontade para a criação de novas realidades.”

O veredicto, enfim, é uma boa obra. Não sou fã de histórias de vampiros, mas sou fã de magia e ficção. Elas sempre têm o pano de fundo da realidade, com fantasias coloridas. Seth Grahame-Smith, no entanto, foi além ao nos fazer praticamente acreditar em vampiros. Cheguei a jogar no google "Abraham Lincoln e vampiros", no afã de descobrir algum boato obscuro que de fato corria em torno no emblemático ícone americano. Isto porque o livro é recheado de fotos da época, a maioria de Lincoln, que foram meticulosamente alteradas no Photoshop para incluir machados, óculos escuros e até mesmo para criar uma foto de Abe com Edgar Allan Poe, seu amigo no livro. Tenho que confessar que nunca sonhei tanto com vampiros como nestes dias.


No mais, em breve a história estará nas telas do cinema, em produção de ninguém menos, ninguém mais, que Tim Burton (Alice no País das Maravilhas). Esperemos até lá!

quarta-feira, 15 de junho de 2011

O Castelo nos Pirineus - Jostein Gaarder



O Castelo dos Pirineus/Jostein Gaarder; tradução Luiz Antônio de Araújo. - São Paulo: Companhia das Letras, 2010. 184 páginas.

Jostein Gaarder é um autor que povoa a minha vida literária de forma intensa. O primeiro livro que li da sua autoria foi "Ei, tem alguém aí?", aos 10 anos de idade. Gostei tanto que fiz a propaganda entre amigas, dei de presente... e esse foi o início de uma paixão. De lá pra cá passei a colecionar seus livros e a esperar ansiosamente por obras novas. Era com deleite que pensava em começar a ler um livro dele, algo como pensar em férias em uma praia paradisíaca. Ocupam a minha estante de livros especiais: "O Mundo de Sofia" (1995), "Maya" (2000), "O Pássaro Raro" (2001), "O Vendedor de Histórias" (2004), "A Garota das Laranjas" (2005), "Ei, tem alguém aí?" (1997), "A Biblioteca Mágica de Bibbi Bokken" (2003), "Através do Espelho" (1998) e "O Dia do Curinga" (1996).

Posso dizer que especialmente "Maya" e "O Dia do Coringa", para não cair no clichê de falar em "O Mundo de Sofia", foram os que mais me marcaram. Posso sentir o cheiro e o paladar de suas leituras.

"O Castelo nos Pirineus" entrou para a lista dos especiais, sem dúvidas. Tinha já alguns anos que não lia nenhum livro de Jostein, de modo que já tinha até esquecido o gosto especial da sua leitura. Ganhei em Janeiro de presente de Toni, incentivado pela minha coleção a conhecer um pouco da sua obra. Leu e me deu, com a seguinte dedicatória: Adorei o livro e espero ler outras obras dele. Mas o lugar deste livro é na sua estante, na sua coleção! Te amo! 12.01.11. Hoje, agradeço publicamente: Obrigada, momor!

O nome do livro, bem como a imagem da sua capa, foram pegos emprestados da obra da artista plástica René Margritte, Le Château des Pyrénées, que apresenta um imenso rochedo pairando na paisagem, tendo em seu topo, um castelo. Tal figura representa exatamente o ponto central da discussão do livro: o improvável.

O livro é composto por e-mails trocados por Solrun e Steinn, antigos namorados que se encontram após 30 anos sem se ver. Cada um seguiu sua vida, casaram e tiveram filhos. Quando se reencontram e passam a se comunicar, tentam entender aquilo que os separou: suas concepções bastante diversas acerca do mundo. Solrun acredita na espiritualidade e na intuição e Steinn na ciência e na razão. O livro é um verdadeiro debate acerca das duas visões de mundo, recheado com episódios fictícios vividos por ambos na juventude.

Claro, a filosofia é o tema central do livro. E não poderia ser diferente. A filosofia e a ciência são os personagens principais de toda a obra de Jostein. O seu livro mais conhecido, "O Mundo de Sofia", o qual, diga-se de passagem, é o mais didático (conta a história da filosofia no mundo), deixa evidente seu animus de escrever. Em entrevista recente, creio que ao site da Companhia das Letras, ele disse que existem dois tipos de escritores: aqueles que escrevem pelo amor à linguagem, e aqueles que escrevem por terem uma mensagem a passar. Ele se auto-enquadrou no segundo grupo. 

É um fato inegável. Em todos os seus livros ele tenta despertar os "por quês" que jazem por detrás da vida e do universo. Como uma discípula fiel às idéias de meu pai, eu amo filosofia, então creio que sempre tive uma pré-disposição nata a gostar da obra de Jostein. O fato dele inserir a filosofia dentro de uma obra ficcional, ambientada em meio às paisagens idílicas da Noruega, tornam a leitura ainda mais saborosa.

Minha coleção.
Além da temática, amo o modo como ele brinca com os personagens e o modo como seus livros se comunicam. Os personagens fogem de um livro a outro, encontram vida em outras histórias e, de certa forma vivem. Será que planejam uma insurgência, assim como planejou Sofia? Quem sabe... O certo é que Jostein, dentro do mundo da sua obra, é o Criador. 

E que se faça a luz! 

segunda-feira, 30 de maio de 2011

A Casa Verde - Mario Vargas Llosa

VARGAS LLOSA, Mario. A Casa Verde; tradução de Ari Roitman e Paulina Wacht. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.

Título original: La Casa Verde
Ano de publicação: 1967

Uma pequena mudança no blog para agregar uma paixão que não tinha por quê ser deixada de lado. Na verdade, foi minha primeira paixão artística. Surgiu aos 5, 6 anos de idade quando lia Ziraldo (As viagens de L, O Menino Maluquinho, Uma professora muito Maluquinha) e Monteiro Lobato (colação inteira que ganhei de presente da mamãe), passando por Jostein Garden, Maurice Druon, José Mauro de Vasconcelos (Meu pé de laranja lima), Adelaide Carraro, J. K. Rowling (claro!), deentre tantos outros autores que marcaram a minha vida. Sim, se penso em uma fase de minha vida, lembro de um livro. Os livros são minha terapia, meu lazer e minha paixão.

Pois bem: ao livro, agora! Em primeiro lugar, devo dizer que esta experiência literária foi graças ao meu namorado Toni, que me deu o livro de presente de Natal. Populismo do amor, pai? =) Não fique com ciúmes! kkk ...

A Casa Verde foi o segundo romance de Llosa, precedido somente pelo primogênito A cidade e os cachorros (1963). É um romance ousado, para não dizer ambicioso. Como a maioria dos seus livros, a história se passa no Peru. Se trago esta informação, não é porque se trata de um mero dado geográfico, mas porque o país é mais do que o espaço onde se passa a história. Posso dizer que o Peru, e mais precisamente, Piura e Iquitos, são personagens da história. Para se ter uma idéia, um mapa da região marca o início do romance.

Talvez o breve apanhado que é delineado atrás do livro crie expectativas acerca de uma história diferente. É que lá é citada apenas uma das várias histórias que se entrelaçam no livro: a da primeira Casa Verde, criada por Dom Anselmo. Traduzindo: um puteiro que é criado na cidade de Piura, quando esta ainda era uma pacato vilarejo. Confesso que imaginei, à primeira vista, se tratar de um romance pitoresco ambientado todo no ambiente do puteiro. Mas o romance é muito mais rico.

Llosa vai além da luxúria e dos desejos humanos. Nas 404 páginas podemos enxergar um retrato nú e cru daquela região: as missões de colonização dos "selvagens" (nativos da região, os pagãos), a máfia dos traficantes de latex e couro, índios aguarunas, huambisas e shapras, a urbanização de Piura e Iquitos, e, claro, o choque entre a população conservadora e toda aquela panacéia de vida.

Tudo isso surge de uma forma, digamos, nada simples. As histórias se entrelaçam de forma desordenada no tempo e no espaço. Você lê uma coisa para só depois entender o porquê. Nos parágrafos se misturam diálogos, pensamentos e lembranças. É um ritmo quase cinematográfico. Esta característica teve inspiração, segundo o próprio Llosa admite no prólogo do livro, nas leituras de William Faulkner.

Para quem leu Travessuras da Menina Má e amou sua leitura, deixo logo o aviso que em A Casa Verde a coisa é bem diferente! Nada de história linear e diálogos bem arranjados. Mas, claro, é um romance muito mais elaborado e profundo. Saio desta história como se tivesse passado uma aventura na Amazônia, quase sinto o cheiro da selva e por pouco não vislumbro no horizonte a famosa Casa Verde.


Recomendo a leitura acompanhada de tempo. Isto porque é um livro que se deve mergulhar de cabeça e ler rápido. Não foi o meu caso, admito. O perigo da falta de tempo é se perder na história. Ainda bem que consegui me encontrar! Valeu a pena... o livro está um pouco castigado, tendo recebido até um inusitado banho de mar, mas com certeza foi muito vivido.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Howl

Diretores: Epstein e Friedman
Ano: 2010




Howl retrata uma fase do poeta Gingsberg, após o lançamento da sua obra homônima - Howl, quando foi acusado de obscenidade. Na verdade o processo foi movido contra o dono da editora que o publicou e o filme se desenrola entre os diálogos no Tribunal, um relato do próprio Gingsberg acerca da sua obra, seguida de reflexões sobre a repercussão da mesma, e cenas da sua própria vida. Entre estes pontos, partes de Howl são declamadas, seguidas de animações que transpõe a letra escrita para a linguagem visual.

Sem sombra de dúvidas, as animações merecem um destaque especial. O trabalho foi de Erick Drooker, que em parceria com os diretores Esptein e Friedman, deram ao filme um toque surreal, ouso dizer.



Gingsberg foi um dos expoentes da geração Beat norte-americana, fruto de uma sociedade que queria ser perfeita, esmagando as ambivalências. Mas estas, uma hora ou outra acabam vindo à tona, e com ferocidade. No caso de Gingsberg, sua homossexualidade foi o centro da sua pluralidade e, por isso, seu grito. Talvez em virtude isto sua poesia tenha uma conotação tão sexual, por ter sido o ponto de ebulição da sua divergência.

James Franco como Gingsberg também fez um excelente trabalho, principalmente nas cenas em que faz as reflexões sobre a obra. Parece que estamos de frente com o poeta, a pensar cada palavra dita, refletindo, sem roteiro.

No mais, vale o destaque para o fato de ser a primeira ficção dos diretores Esptein e Friedman, diretores do documentário The Celulloid Closet, de 1995.